quinta-feira, 3 de janeiro de 2008

Desconfortos de fim de ano

Esta época de festas é muito interessante. Você começa recebendo um monte de cartões e mensagens de pessoas físicas e jurídicas que você nunca viu mais gordas, nunca vendeu nem comprou nada delas, sequer sabia que existiam. Mas todas te mandam um cartão virtual como se fossem seus velhos amigos.

Isso que dá ficar assinando listas de tudo quanto é coisa que você recebe, repassar e-mails com piadas, correntes, powerpoints de autoajuda, criancinhas desaparecidas, sem sequer dar-se ao trabalho de ocultar as centenas de nomes de seus amigos e conhecidos, que vão engordar as listas de "milhões de e-mails por apenas R$ 45,00!!!"

Mas uma forma moderna de seu endereço virar mais um, é deixar sua ficha cadastral nesses sites que agora viraram moda: os de amigo secreto virtual.

Isso mesmo, em vez da velha urna feita com caixa de sapatos, estrategicamente colocada perto do café, e dos bilhetinhos escritos à mão (geralmente a esquerda pro amigo não desconfiar), numa letra de forma que você nunca usa, com canetas de tintas esquisitas ou com frases compostas com letras e palavras recortadas de jornal, agora um colega cria um espaço virtual num site tipo www.amigosecreto.qualquercoisa, e em troca de um dossiê completo de todos os funcionários da empresa (única forma de usufrurir dos serviços), o site permite que todos mandem e recebam bilhetinhos virtuais. Não sem antes clicar no "concordo" do termo de compromisso (sem ler uma linha sequer, claro) o que dá ao site o direito de vender o seu e-mail para parceiros que vão depois inundar sua caixa postal com bobagens.

Depois da festa de amigo secreto da firma, onde todo mundo – da recepcionista ao presidente – fica irreconhecível, vem a tradicional ceia de natal em família. E junto com ela todas as discussões que se repetem ano após ano como se fosse a primeira vez: vai ser na casa de quem – ahhh não! de novo? quem leva o perú? fulano nunca traz nada mas come feito um esfomeado. E a louça que sempre sobra para a vovó lavar – coitada. Xiii, acho que este ano as crianças não vão mais acreditar que o papai noel não é o tio Zé? Se não servir, pode trocar viu, eu guardei a notinha...

E alguns dias depois, reveillon. Onze e meia vamos todos para a praia, roupa branca, chinelo de dedo. Pulamos as sete ondas e a cada pulinho um pedido: pedimos por nós e para nós, pelos amigos que pouco vemos, pela família que pouco nos vê, pedimos que tudo seja diferente no ano que começa. Pedimos o melhor, fazemos propósitos de mudar e quando a festa acaba o melhor de nós fica lá esparramado na areia, sendo engolido e vomitado pelo mar no seu interminável vai e vem: nossas pegadas, nossos saquinhos plásticos, embalagens de salgadinhos, isopores, pratos e copos descartáveis, velas, flores, garrafas com restos de champanhe barato.














Imagem: oglobo.globo.com


E assim começa mais um ano, no qual acreditamos que tudo vai ser diferente, mesmo a gente continuando a fazer tudo igual. Às vezes penso que o que a gente gosta mesmo é de que tudo permaneça como está. Sem supresas. Sem esforço. E principalmente sem desconforto.

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