quarta-feira, 3 de dezembro de 2008

Impunidade é "o" problema.

Quando nos debruçamos sobre as dificuldades que nos impedem de avançar, desenvolver-nos, sejam as enfrentadas por uma família, uma organização ou um país, costumamos elencar uma série de problemas que, teoricamente, precisariam ser resolvidos antes, para que as coisas realmente funcionem e sejamos felizes.

Por exemplo, ao passar os olhos pelo noticiário político, econômico e social, ou a simples observação da realidade e da nossa história recente, nos apontam que estamos cheios de problemas. E muito se escreve sobre as possíveis soluções. Catedráticos apresentam teorias, economistas defendem suas teses, cientistas sociais fazem prognósticos, matemáticos levantam e comparam estatísticas, e políticos fazem alarde de suas plataformas.

Bem, eu tenho um pensamento: não acho que tenhamos vários problemas. Penso, sinceramente, que temos um só. Por exemplo:

A corrupção não é um problema, o problema é a impunidade
dos que se locupletam com a certeza de que sairão impunes de qualquer falcatrua.

A violência não é um problema, o problema é a impunidade
dos que a cometem, sabendo que a justiça é lenta e que, com um pouco de dinheiro e bons advogados, dá pra continuar solto indefinidamente, cometendo inclusive novos e maiores delitos.

A fome não é um problema, o problema é a impunidade
dos que têm o poder de acabar com ela e não o fazem, simplesmente porque esse problema não é prioridade para eles que comem todos os dias.

A falta de saúde e de educação não é um problema, o problema é a impunidade
e a dificuldade para enquadrar e prender toda a cadeia de maus políticos e maus servidores envolvidos no desvio recorrente dos recursos destinados a quem precisa deles.

A falta de segurança não é um problema, o problema é a impunidade
dos que traficam, aliciam, corrompem, contrabandeiam e matam para defender seus interesses enquanto o Estado assiste a tudo com uma condescendência disfarçada de impotência.

O desmatamento, as agressões à natureza e a extinção das espécies não são um problema, o problema é a impunidade
dos que conhecem a gravidade desses fatos, tem os instrumentos e os recursos para combatê-los, mas preferem empurrar o problema com a barriga para as próximas gerações a se indispor com os interesses dos poderosos.

A lista você mesmo pode continuar a partir daqui. E pode fazer o exercício colocando no lugar dos “problemas” do País, os que você vê na sua empresa, na sua família, no condomínio onde você mora... Todas as questões se resolvem, quando termina a impunidade.

terça-feira, 11 de novembro de 2008

CARTA A OBAMA

“Sr. Barack Obama,

Antes de mais nada saiba que resisti muito em lhe escrever.

Faz quase uma semana que o senhor foi eleito presidente da nação mais poderosa do mundo e eu ainda estou pensando no que isso poderá significar – para o senhor, para a dona Michelle e as meninas, para o resto dos americanos, e para nós, o resto do mundo. Não é por falta de análises ou de opiniões, pois todos os jornalistas, políticos, economistas, historiadores e filósofos, de todas as correntes, tendências e colorações, já deram o seu vaticínio sobre os novos tempos que virão. Não serão fáceis, dizem, mas está todo mundo botando a maior fé no seu taco.

Não que a sua eleição seja pouca coisa, não. Fazer o que o senhor fez é uma proeza e tanto. Mas tem uma série de dúvidas que ficam martelando aqui na minha cabeça. Algumas coisas que, sinceramente, me deixam preocupado. E que devem estar também, se não tirando o seu sono, pelo menos fazendo-o acordar no meio da noite.

Veja: o senhor foi eleito para resolver os problemas dos Estados Unidos, certo? Mas o pessoal está esperando mesmo é que resolva os problemas do mundo. É como se o senhor tivesse sido eleito presidente do planeta. Vai ter de ir lá e resolver a parada. Consertar o estrago. E qualquer coisa menos que isso, vai ser uma decepção, um fracasso, vão dizer “não falei, foram votar nesse nêgo aí achando que ele ia ser o salvador da pátria, agora aguenta...”.

Outra coisa que temos de concordar: todos esses problemas que a gente tem hoje, essa situação que aí está – como diria um bom político, não são fruto só da cabecinha ou da vontade de um presidente – mesmo essa cabecinha sendo a do Bush, certo? Portanto, a solução também não será. Precisamos ver se, passada a euforia, o pessoal vai estar preparado para pagar o preço, que o senhor sabe, é alto.

Depois, não podemos esquecer que o senhor teve apenas 52% dos votos. Os outros 46% foram para o branquelo, amigo do Bush. E, aqui entre nós, não foram os americanos que elegeram o senhor, certo? Foram os africanos, os portoriquenhos, cubanos, mexicanos – latino-americanos em geral, os iranianos, os indianos, árabes, os muçulmanos – talvez até alguns judeus. Tá bom, tá bom, os filhos e netos deles são americanos legítimos (?). Mas, essa moçada toda, até fala inglês na escola e no trabalho, mas em casa fala a língua dos avós, come a comida dos avós, preserva a história dos avós. Esses estão vibrando com a sua vitória. Mas os outros, os branquelos, estão é morrendo de ódio. Viu a cara deles quando o McCain disse “ele era meu oponente, agora é meu presidente? ” Aquele olhar estático, nenhuma reação, nem um músculo da face movido. Eu estaria mais tranquilo se tivessem xingado o McCain, vaiado o McCain, aplaudido o McCain. Mas, nada. Só silêncio...aquele olhar vazio, perdido...

Sr. Obama, temo pelo senhor e pelas meninas, eu também tenho duas quase da mesma idade das suas, e sei a preocupação que dão. Desculpe, não quero assustá-lo, mas se eu fosse o senhor contratava logo uma meia dúzia de negões – não, negões não... vão chamar o senhor de racista. Pensando bem, se forem brancões também vão chamar, então contrata os negões mesmo, pelo menos eles têm mais tempo de carteira assinada – e colocava eles dia e noite ao lado da Sra. Obama e das meninas. Ao lado, atrás e na frente, tipo sombra mesmo que dependendo da hora do dia fica num lado diferente da gente. Afinal, por melhor que seja o seu vice (aqui em Sampa tivemos uma experiência ótima com um vice) ninguém quer ver ele sentando na sua cadeira.

E, por favor, nada de revidar os séculos de escravidão e opressão mudando o nome da Casa Branca para Casa Negra ou algo parecido. Um cara esclarecido como o senhor sabe que “Casa Branca” é apenas uma maneira de falar.

Boa sorte no seu novo emprego, Sr. Obama.”

De um admirador.

SOBRE DESENVOLVIDOS

Dia desses ouvi na CBN o finalzinho de uma entrevista do Heródoto Barbeiro com um ilustre economista catedrático da USP (pra sorte dele, ou minha – não sei, não consegui ouvir seu nome) analisando a atual crise mundial.

Dizia assim o professor: “nos Estados Unidos há 1 automóvel para cada 1,5 habitantes. No Brasil, apenas 1 para cada 7,5 habitantes. Ainda temos um longo caminho a percorrer em relação aos países mais adiantados”.

Sem entrar no mérito das estatísticas, e olhando para a delicadeza da situação ambiental e do momento histórico que atravessamos (com perdão do lugar comum), pergunto ao ilustre professor: temos um longo caminho a percorrer para chegar aonde, exatamente? E países adiantados em quê?

Me parece que é preciso começarmos a olhar para a frente, e não para trás, reconhecendo que alguns modelos estão falidos, que temos que reinventar o futuro. Afinal, o sistema que construímos nos trouxe até o abismo. Achar que temos de continuar insistindo em ter mais do mesmo, é...dar um passinho à frente.

Um automóvel por habitante...sim senhor! Brilhante, hein?

segunda-feira, 13 de outubro de 2008

Porquês

Assim como eu, você deve ter um milhão de perguntas pipocando na sua cabeça. Questões às vezes sérias, às vezes críticas, às vezes engraçadas, às vezes dramáticas, às vezes curiosas, que certamente têm uma resposta. Nem sempre óbvia, lógica ou conveniente. Porque se assim fosse, teríamos as respostas. E não as temos. E quando fazemos essas perguntas a quem deveria respondê-las de forma clara e direta - empresas, governos, órgãos públicos, instituições, nós mesmos - as respostas não raro são evasivas ou políticas, o que dá no mesmo.

Então, eu proponho começar a lista com alguns porquês e convido os leitores deste blog a me ajudar a expandi-la. Convido também quem tiver as respostas, a postá-las aqui em benefício de todos. Quem sabe a gente inicia um diálogo produtivo e ajuda a prestar um serviço de utilidade pública?

Obs.: numerei as perguntas, para ser mais fácil postar e identificar as respostas.


1 - Porquê os carregadores de celulares são todos diferentes, com buraquinhos diferentes, o que obriga você, involuntariamente, a aumentar o lixo do planeta? Além de nunca encontrar alguém no escritório que tenha um igual ao seu quando você esqueceu de carregar seu telefone?

2 - Porquê os fabricantes não produzem e as lojas não vendem, calças masculinas que tenham um comprimento de pernas razoável, das quais você não precise cortar metade para poder vesti-las? Ok, ok, eu sei que eu sou baixinho, mas TODAS as calças parecem ser feitas para jogadores de basquete!

3 - Porquê quando você vai comprar alguma coisa financiada, nunca consegue saber exatamente quanto lhe custará?

4 - Porquê você nunca consegue concluir uma conversa pelo celular sem fazer pelo menos umas 3 ligações?

5 - Porquê 99% das pessoas não dão a descarga quando usam um banheiro público?

6 - Porquê 99% das pessoas ficam indignadas quando encontram um banheiro público em que alguém não deu a descarga?

7 - Porquê o semáforo da esquina seguinte fecha 3 segundos depois que abre o seu?

terça-feira, 26 de agosto de 2008

Pais: reflitam

(A título de introdução: recebi este texto de uma amiga comum, e como não é uma dessas coisas que ficaram circulando pela net, tipo corrente, filosofia de salão de cabeleireiro, ppt de auto-ajuda, etc, resolvi – sem a autorização da autora, mas com o devido crédito – publicá-lo e compartilhar com os generosos leitores deste blog. Espero que apreciem. Obs.: os grifos são meus...)

Somos as primeiras gerações de pais decididos a não repetir com os filhos os erros de nossos progenitores. E com o esforço de abolir os abusos do passado, somos os pais mais dedicados e compreensivos, mas, por outro lado, os mais tolos e inseguros que já houve na história. O grave é que estamos lidando com crianças mais 'espertas', ousadas, agressivas e poderosas do que nunca.

Parece que, em nossa tentativa de sermos os pais que queríamos ser, passamos de um extremo ao outro. Assim, somos a última geração de filhos que obedeceram a seus pais e a primeira geração de pais que obedecem a seus filhos...Os últimos que tivemos medo dos pais e os primeiros que tememos os filhos. Os últimos que cresceram sob o mando dos pais e os primeiros que vivem sob o jugo dos filhos. E, o que é pior, os últimos que respeitamos nossos pais e os primeiros que aceitamos (às vezes sem escolha...) que nossos filhos nos faltem com o respeito.

À medida em que o permissível substituiu o autoritarismo, os termos das relações familiares mudou de forma radical, para o bem e para o mal. Com efeito, antes se consideravam bons pais aqueles cujos filhos se comportavam bem, obedeciam suas ordens e os tratavam com o devido respeito. E bons filhos, as crianças que eram formais e veneravam seus pais.

Mas, à medida que as fronteiras hierárquicas entre nós e nossos filhos foram-se desvanecendo, hoje, os bons pais são aqueles que conseguem que seus filhos os amem, ainda que pouco os respeitem. E são os filhos quem, agora, esperam respeito de seus pais, pretendendo de tal maneira que respeitem as suas idéias, seus gostos, suas preferências e sua forma de agir e viver. E, além disso, que os patrocinem no que necessitarem para tal fim.

Quer dizer; os papéis se inverteram, e agora são os pais quem têm que agradar a seus filhos para “ganhá-los” e não o inverso, como no passado. Isto explica o esforço que fazem hoje tantos pais e mães para ser os melhores amigos e 'dar tudo' a seus filhos. Dizem que os extremos se atraem. Se o autoritarismo do passado encheu os filhos de medo de seus pais, a debilidade do presente os preenche de medo e menosprezo ao nos ver tão débeis e perdidos como eles.

Os filhos precisam perceber que, durante a infância, estamos à frente de suas vidas, como líderes capazes de sujeitá-los quando não os podemos conter, e de guiá-los enquanto não sabem para onde vão. Se o autoritarismo suplanta, o permissível sufoca.
Apenas uma atitude firme, respeitosa, lhes permitirá confiar em nossa idoneidade para governar suas vidas enquanto forem menores, porque vamos à frente liderando-os e não atrás, os carregando e rendidos à sua vontade.

É assim que evitaremos que as novas gerações se afoguem no descontrole e tédio nos quais está afundando uma sociedade que parece ir à deriva, sem parâmetros nem destino.

Os LIMITES abrigam o indivíduo. Com amor ilimitado e profundo respeito.

Autora: Monica Monastério (Madrid-España)

segunda-feira, 25 de agosto de 2008

Trânsito parado...

CARROPRETO CARROPRETO CARROPRETO CARROPRETO CARROPRETO CARROPRETO CARROPRETO CARROVERMELHO CARROPRETO CARROPRATA CARROPRATA CARROPRETO CARROPRATA CARROPRETO CARROAZUL CARROPRETO CARROPRETO CARROPRETO CARROPRETO CARROPRETO CARROPRETO CARROPRETO CARROPRETO CARROAMARELO CARROPRATA CARROPRATA CARROPRATA CARROPRATA CARROPRATA CARROPRETO CARROPRETO CARROPRETO CARROPRETO CARROPRETO CARROPRATA CARROPRETO CARROPRATA CARROPRATA CARROAZUL CARROPRETO CARROPRATA CARROPRETO CARROPRETO CARROPRETO CARROPRETO CARROPRETO CARROPRETO CARROPRETO CARROVERMELHO CARROPRETO CARROPRETO CARROPRETO CARROPRETO CARROPRETO CARROPRETO

segunda-feira, 18 de agosto de 2008

Meditar andando

Antes de me levantar da mesa olho para o superguardanapo de folha tripla 40x40 cm e, depois de constatar que eu mal o usei, dobro-o e guardo no bolso. Penso: antes de ir para o lixo ainda dá pra limpar as lentes do óculos, tirar o pó da mesa ou assoar o nariz. O garçom e os dois amigos que dividem a mesa comigo ficam olhando, mas abstêm-se de comentários.

Enquanto transponho as seis quadras até o escritório vou meditando sobre o trabalho que dá ser ecologicamente correto. E como a cultura do desperdício continua sendo cultivada, muitas vezes inconscientemente, neste lado do planeta. Automatismos, hábitos arraigados dos quais sequer nos damos conta.

Por outro lado, penso se o que acabo de fazer não seria uma daquelas coisas “de pobre”, como usar o vidro de requeijão como copo, cortar o fundo da garrafa pet para colocar plantinha, esquentar a caneta bic com o bafo para ela voltar a escrever, usar sacola plástica para botar o lixo, espremer o tubo de pasta de dente até o finzinho.

Sim, porque essas coisas só sendo pobre ou sobrevivente de guerra, certo?

Errado! Não se trata mais de saber se é coisa de pobre, rico ou remediado. Se fomos bem ou mal educados. Se queremos ou não ser politicamente corretos ou ambientalmente responsáveis. Trata-se de escolher se queremos continuar sendo inquilinos neste planeta nas próximas décadas, ou se não estamos nem aí e dane-se se formos despejados. Sim, porque com a nossa pequena cabecinha e a nossa grande pretensão acreditamos que ao mudar pequenos hábitos estamos contribuindo para "salvar o planeta".

Meu amigo, o planeta não está nem aí com o que você acredita ou deixa de acreditar. Está se lixando se você vai ou não mudar sua maneira de viver, ou de morrer. Quando ele se cansar das bobagens que estamos fazendo, dará uma pequena sacudida e em poucos segundos desapareço eu, você e o continente. Desaparece a nossa civilização e junto com ela nossa arrogância. E ele, planeta, continuará sua trajetória.

Então, vamos parar de achar que somos o umbigo do mundo e acordar: quem corre o risco de ser extintos somos nós, não é o planeta.

Abre parêntesis. Outro dia fiz um teste no site da WWF pra saber o tamanho da minha pegada ecológica. Em outras palavras, que rastro estou deixando na minha passagem pelo planeta. Recomendo: http://www.pegadaecologica.org.br. Você responde umas perguntas sobre seu estilo de vida e hábitos de consumo, o site avalia o impacto da sua pegada sobre o meio ambiente e te diz quantos planetas Terra seriam necessários se todo mundo resolvesse viver como você.

Não me considero nem um pouco consumista, procuro separar o lixo reciclável do outro e dar-lhes a destinação correta, tenho uma razoável consciência sobre o meu compromisso com a sustentabilidade e o futuro das próximas gerações. Ainda assim, no meu caso, seriam necessários 3 planetas para agüentar o tranco. Tem idéia? Fecha parêntesis.

Voltando para a minha meditação, diminuo um pouco o passo e lembro de uma revista TRIP de uns dois anos atrás cuja matéria de capa tinha um sugestivo titulo: Sua felicidade está acabando com o planeta. Medito mais um quarteirão sobre isso. E continuo andando.

Antes de atravessar a esquina viro minha cabeça para o leito carroçável e vejo passar, um atrás do outro, três possantes veículos off road. Cada um mais possante do que o outro. Todos 4x4. Todos tinindo. Todos com vidro fumê. Todos com uma pessoa só dentro. Todos pretos (já reparou que não existem mais automóveis coloridos? Henry Ford deve estar radiante).

Penso, sem medo de errar: jamais algum deles saiu do asfalto. Afinal, você acha mesmo que alguém vai comprar um automóvel que custa um apartamento para enfiá-lo no meio do mato onde ninguém vê? Para sair de lá todo sujo de terra? Nem pensar. A propósito, lembro de uma entrevista de Paulo Mendes da Rocha – arquiteto e sábio, à revista Carta Capital, que atesta bem a irracionalidade deste nosso modelo: "É como se tivéssemos inventado uma máquina de produzir veneno e, todo dia, nos empenhássemos em aprimorá-la. A questão dos transportes é fundamental. Não se trata, puramente, de introduzir conforto. Trata-se de ver que, queimar petróleo para transportar uma pessoa de 60 quilos numa lataria de 700 quilos, que não anda, é um erro grave. É repugnante ver a cidade congestionada de carros que não andam. A questão não é fazê-los andar, é ver que isso não tem saída, o transporte individual é uma bobagem."

Finalmente, chego ao escritório um pouco cansado e com sede. Vou até o bebedouro e depois de sorver calmamente dois copos de água geladinha (até quando?) outra grande dúvida me assalta: o que faço com mais um copo de plástico, novinho, antes de descartá-lo?

É... não tá fácil diminuir a pegada. Acho que vou dar mais umas duas voltas no quarteirão.

terça-feira, 5 de agosto de 2008

Eu quero um par de meias

A impressão que eu tenho folheando os jornais e revistas, vendo televisão ou acessando portais de compras na internet, nesta época de dia dos pais, é que 100% dos filhos vão dar um celular de presente. Ou pelo menos é isso que as lojas imaginam. Parece também que o celular é o único item que elas têm no estoque.

Foi assim no dia das mães, foi assim no dia dos namorados, logo vai ser assim no dia das crianças (aimeudeus!). E a falta de imaginação não é só das lojas de celulares, não. Os aparelhinhos enchem as páginas dos anúncios dos magazines (que antes vendiam roupas, utensílios domésticos, ferramentas, perfumes, lembra?), dos supermercados, dos hipermercados, das operadoras, das Casas Bahia e similares, das lojas de eletro-eletrônicos e por aí vai.

Os celulares também são o prêmio de 90% das promoções. Ou seja: o mundo, os interesses, os sonhos de consumo se reduziram a um aparelho celular.

Ai que saudades do tempo em que a falta de imaginação era dar gravata, meia ou cueca para o pai. Pelo menos os filhos tinham três opções.

sábado, 31 de maio de 2008

Midiotas. Ou me engana que eu gosto.

Gosto de cozinhar. E de comer. Não necessariamente nessa ordem. E - desculpe o lugar comum - minha mãe teve muito a ver com isso.

Quando criança eu acordava com o cheiro de pão quentinho subindo pelas escadas da casa assobradada onde morávamos no norte de Portugal. A primeira fornada ela tirava por volta das cinco da manhã, para alimentar não somente a nossa família, mas muitas outras na aldeia, que encomendavam.

O pão redondo de casca grossa e dura, e miolo macio, era apenas uma das iguarias irresistíveis para mim. Mas minha mãe também fazia alheiras, lingüiças, presunto, chouriços de todos os tipos e quase tudo que ia para a mesa da família e dos clientes da taberna que funcionava no salão térreo da nossa casa: a Taberna da Carolina. Sim, porque enquanto meu pai se dedicava a outras lides, entre elas semear, cultivar e colher os frutos da terra, ela cultivava os filhos, a casa, os clientes, os amigos, e transformava tudo em delícias. Ah, produzíamos vinho e azeite também.

Assim, desenvolvi desde cedo uma certa sensibilidade para apreciar sabores, aromas, texturas... Sem nenhuma pretensão de ser ou parecer um crítico gastronômico (arghhh!) sei dizer se um vinho é digno de ser tomado. Mas por favor, não me peça para explicar.

Tudo isso para dizer que não entendo como a mídia e alguns críticos conseguem endeusar pratos ou petiscos de qualidade duvidosa e transformar casas simplesmente medianas em verdadeiros locais de peregrinação. Pensando bem, eu entendo sim. O que não entendo é como a massa (a social) engole tudo sem questionar nada, acotovelando-se muitas vezes para pagar caro por algo que nem de graça deveria ser servido.

Quer uns exemplos?

A mídia não se cansa de repetir: o melhor pastel de bacalhau de São Paulo é o do Mercadão! Gente do céu, você já provou aquilo? Já sentiu aquela massa empapuçada, de bacalhau de segunda, desfiado, seco, sem um molhinho sequer, sem um temperinho pra facilitar a descida pela goela? E olha que além dele ter presença garantida na lista dos 10 melhores petiscos da cidade, já foi até elogiado pelos melhores chefs de cozinha que, claro, não entendem nada de pastel. Pra mim a única explicação plausível é que, cansados de comer suas finas iguarias, de vez em quando curtem uma junk food, só pode ser.

E o sanduíche de mortadela? Outro engodo que leva milhares de paulistas ao mercado central, fazendo fila pra engolir dezenas e dezenas de fatias de mortadela (boa mortadela, justiça seja feita) no meio de um indefeso pãozinho francês. Mas como, se o bom do sanduíche é fruto justamente daquele equilíbrio delicado entre o pão e o recheio? As duas vezes que comi pedi mais dois pãezinhos extras e ainda sobrou mortadela. Ora, faça-me o favor! Qualquer boa padaria, que faça um pão francês decente (muito mais difícil de achar do que uma boa mortadela, diga-se de passagem) faz um sanduíche exatamente igual, não tem segredo. Mas...não, igual “aquele” do Mercadão não existe. Saiu na Vejinha!

Engolimos absurdos também em alguns botecos “chic” da cidade, sem exercer o mínimo de autocrítica. Já pediu a picanha fatiada que você mesmo prepara em chapa quente sobre a sua mesa, respingando gordura pra todo lado? Ah, o lugar é superlegal, cheio de gente bonita... o único problema é que você sai de lá cheirando fumaça e tem de ir direto pro chuveiro tirar o óleo do cabelo. Começa que as mesinhas ficam a menos de meio metro uma da outra – tem de caber todo mundo! E se você não pediu picanha, azar o seu. Vai respirar picanha, vai engolir fumaça de picanha, vai ficar cheirando picanha da cabeça aos pés. Embora você e a mídia – saiu no Guia da Folha – não estejam nem aí.

Mais: você gosta de cachaça? Se gosta e degusta, deve saber que há excelentes cachaças no mercado, como a Claudionor, por exemplo, que não custam mais de 15 reais no varejo. Claro que outras, também muito boas, chegam a custar 40, 50 reais a garrafa. Pois bem, em muitas cachaçarias e botecos chiques a dose de todas elas pode valer 6, 7, às vezes até 8 reais. Tanto a que custa R$ 10 a garrafa, como a que custa R$ 40.

Já se esbaldou no balcão de acepipes do seu boteco preferido? Vai pagar por 100 gramas de beliscos – incluindo azeitona, champignon, salaminho, cebolinha, queijinho mussarela, umas lasquinhas de parmesão, presunto crú – algo em torno de 6 reais. Uma continha rápida de cabeça e você descobre que está pagando 60 reais por um quilo de tremoço, um quilo de cebolinha, um quilo de salame ou um quilo de azeitona.

Mas quem é que faz contas? O dono do boteco faz, sorte dele.

Veja (do verbo ver, não a revista): não estou dizendo que esses lugares não mereçam uma visita. Merecem várias. Estou dizendo, simplesmente, que não dá pra não ler... o cardápio, não dá pra não ver... os absurdos, e não dá pra não achar que, a nível de consumo, às vezes somos todos um pouco midiotas.

sexta-feira, 8 de fevereiro de 2008

Mais respeito com as palavras!

Dia desses, minha filha menor, Sofia (sabedoria...) de 8 anos, disparou do nada: – Paiê, cê já reparou que quando a gente repete, repete, repete muuuiiito uma palavra, ela perde o sentido? Referia-se a uma brincadeira que ela sempre faz, uma repetição repetida (!) bem rápido tipo "travesseiro travesseiro travesseiro travesseiro travesseiro travesseiro..." depois de um tempo o cérebro realmente não encontra mais significado para esse amontoado de letras.

Brincadeira à parte, a observação da Sofia me lembrou outra coisa que sempre me chamou a atenção: o (ab)uso indiscriminado de algumas palavras ou expressões rouba-lhes realmente o significado. Por exemplo, a palavra URGENTE, antigamente significava que alguma coisa urgia, e que se não fosse resolvida com presteza, o desastre seria iminente. Pois bem, hoje, urgente, não significa quase nada, porque tudo é urgente. Repare onde você trabalha a pilha de assuntos urgentes que todo mundo tem pra resolver em cima da mesa, quando não na gaveta. O chefe quer falar com você urgente! O cliente vai viajar e precisa disso urgente (é incrível como um trabalho urgente vem sempre acompanhado de um cliente que vai viajar).

MASTER, o que significa master? Antigamente, master era o máximo. Hoje, pode ser o básico, salto baixo, sem jóias. Qualquer plano de saúde, categoria de sócio, assinatura de tv a cabo, é master. Agora, quando oferece um pouquinho mais, aí já é PLUS! Master Plus então, nem se fala... é quase nada. ESPECIAL, coitado, já virou sinônimo de piada, de tanto ser usado para adjetivar o cliente e começar o texto das malas diretas.

VOSSA EXCELÊNCIA antigamente significava a mais alta expressão de estima e consideração. E hoje? Bem, se for proferida da tribuna de uma das casas do Congresso em Brasília, pode significar desde calhorda, até safado, corrupto, traidor, sem vergonha ou ladrão, para ficarmos nos significados mais leves.

Mas a falta de respeito e de significado também atinge as expressões.

Por exemplo, antigamente (aliás ANTIGAMENTE também é meio difuso, não? antigamente quando? mês passado, ano passado, século passado?), mas continuando, antigamente quando você chegava atrasado a uma reunião e dizia: GENTE, PEGUEI O MAIOR TRÂNSITO! significava que naquele dia o caminho que você sempre faz estava especialmente ruim, alguma coisa grave aconteceu, a quantidade de carros na rua foi surpreendente. Hoje "gente, peguei o maior trânsito" significa apenas que você não se deu ao trabalho de arrumar uma desculpa melhor. Ou então que acordou tarde, que não está nem aí com os horários dos seus compromissos e que a sua falta de respeito não é somente com as palavras, mas também com o tempo e a inteligência dos demais. Nessas horas, o melhor é chegar, entrar de fininho na reunião, sentar de boquinha fechada e no final pedir desculpas, simplesmente, pelo atraso.

A propaganda – de onde eu tiro meu sustento, pra quem não sabe – o marketing direto, o telemarketing, a promoção e assemelhados, também têm culpa no cartório. VOCÊ É MUITO ESPECIAL PARA NÓS significa que vão te deixar esperando na linha pelo menos uns dez minutos. NOVO não significa, necessariamente, que você nunca viu antes. GRÁTIS não quer dizer que não vai custar nada. MEU SENHOR... assim com reticências e tudo, significa que o seu interlocutor está perdendo a paciência e fazendo um esforço danado para parecer gentil e educado.

Bem, a lista pode ser maior se você me ajudar e postar o seu comentário com outras palavras e expressões que perderam o sentido e o significado. Enquanto isso vou discutindo o assunto com a Sofia.

quinta-feira, 7 de fevereiro de 2008

Biosfera interna

Todos os anos no plenilúnio de maio os membros Cafh (caminho espiritual do qual participo desde 1974 e imã que norteia o ponteiro de minha bússola pessoal – para saber mais: www.cafh.org) se reúnem em Assembléia Geral, em algum lugar do planeta. No encontro o Diretor Espiritual mundial de Cafh faz duas alocuções aos participantes, uma na abertura e outra no encerramento.

Ano passado, no encerramento, ele transmitiu uma mensagem muito interessante, que eu gostaria de dividir com você. Fala sobre a necessidade de – paralelamente aos nossos esforços para cuidar do meio ambiente exterior – prestarmos atenção ao nosso meio ambiente interior. Ali onde também há poluição, desperdício de recursos não renováveis (tempo, por exemplo) e do qual precisamos cuidar para benefício próprio e, principalmente, dos demais.


Não vou reproduzir a alocução inteira, por
ser extensa. Ficarei apenas nos pontos principais que giram em torno dessa idéia. Para facilitar o entendimento de algumas expressões, introduzi algumas notas de rodapé. Apreciaria seus comentários.


Cuidemos do nosso meio ambiente interior
Extrato da palestra de José Luis Kutscherauer – Diretor Espiritual de Cafh(1), no encerramento da Assembléia Anual de Cafh, realizada em Mendoza, AR, em junho de 2007.


“Nos últimos anos tomamos consciência dos problemas que afetam o planeta e dos efeitos que nossas ações provocam na biosfera. Como conseqüência, ecologia e meio ambiente se converteram em palavras habituais. Poderíamos dizer que em apenas duas gerações se criou uma consciência global de que é nossa responsabilidade cuidar da Terra – a casa que compartilhamos. Cada vez mais aparecem os chamados de alerta sobre aquecimento global, camada de ozônio, poluição do ar e dos rios, convocando-nos a cuidar de recursos como o ar, a água, as matas, a terra, as espécies animais.

Sem dúvida, temos que estar atentos a todos esses elementos para amenizar os efeitos negativos que produzimos. Por maiores e mais complexas que pareçam as dificuldades que enfrentamos, cresce dia-a-dia o interesse e o compromisso na busca de soluções viáveis, imediatas, simples e efetivas.

Porém, como membros de Cafh, compreendemos que temos muito mais para cuidar, já que trabalhar para minimizar o impacto que produzimos no meio ambiente não encerra nossa tarefa.

Voltemos o olhar também para o nosso meio ambiente interior.

Para poder realizar a mudança que desejamos, comecemos por transformar nosso mundo interior, construindo um ambiente harmônico que nos converta em seres humanos integrais. É nesse meio interior que temos de começar a tarefa.

Dizem que cada pessoa é um mundo. E assim é: cada um de nós é um mundo, com um modo de viver próprio e que deriva de nossa condição humana e do tipo de ambiente no qual habitamos. A condição humana conforma um marco dentro do qual nos desenvolvemos. O ambiente em que vivemos – tanto interior como exterior – é a variável sobre a qual podemos atuar para conformar a biosfera espiritual que queremos que nos contenha.

Ao tomar consciência de que somos portadores de um meio ambiente interior e que este incide sobre os demais, também tomamos consciência de que temos que protegê-lo e cuidar do seu equilíbrio. Assim, compreender – entender e atuar em conseqüência – nos leva a comprometer-nos com essa biosfera interna, espiritual, vulnerável, sutil, porém fundamental para desenvolver-nos como seres humanos integrais.

Por sermos livres e termos a faculdade de escolher, podemos transformar um deserto em um vale fértil e um vale fértil em deserto, purificar o ar multiplicando bosques ou fazê-lo irrespirável desmatando-os, manter as águas claras e cristalinas ou transformá-las em um fedorento lodaçal.

A mesma coisa acontece em nosso meio ambiente interior.

Somos depositários de imensos tesouros que temos que cuidar, potencializar e repartir. Devemos perguntar-nos quais são os bens que queremos deixar como herança para a humanidade. Especialmente, devemos recordar que dentro de nós também existem recursos não renováveis pelos quais temos que responder: o uso do tempo, as energias vitais, o potencial mental e afetivo, tudo está em nossas mãos, sob nosso cuidado, para utilizar e dispor.

Pensemos, por exemplo, no ecossistema constituído por nossos pensamentos. Protejamos esta fonte de vida que é a nossa mente. Ponhamos nossa inteligência a serviço do bem comum, já que entre todos constituímos o corpo da humanidade.

Pensemos ainda no ecossistema constituído por nossos sentimentos e aspirações. Protejamos nosso meio interior para que albergue sentimentos de amor, de compaixão, de compreensão e amizade.

O estudo da ecologia nos ensina a observar as relações sistêmicas entre os indivíduos e o meio ambiente e a perceber que, para manter o equilíbrio, é indispensável a interdependência, já que cada parte ocupa o lugar que lhe corresponde e realiza uma função determinada, contribuindo para o equilíbrio do todo maior.

Necessitamos dar espaço a esta atitude – de interdependência – para que conscientemente unidos cumpramos a nossa missão na Grande Obra (2).

Através de um processo de desenvolvimento da consciência, descobrimos a estreita inter-relação entre todo o existente. Por que, então, na prática atuamos muitas vezes como se vivêssemos de forma autônoma? Pode ser que temamos o poder coercitivo de quem quer impor-se ou submeter-nos. Pode ser que temamos que o viver em função do todo anule a nossa individualidade.

Seja como for, compreendamos que não podemos deixar de pertencer ao todo, porque somos parte integrante dele. O individualismo segrega, porque é contrario à lei da vida que conduz para a integração, para a união. Em nossa ignorância, o que tentamos fazer é negar-nos esse pertencer ao todo.

Na interdependência não há imposição e ninguém deixa de ser o que é. Cada um é um individuo que não se repete, único. Quando se revela aos nossos olhos nossa realidade egoente (3), deixamos de lado temores e dúvidas, nossos esforços individuais se reforçam e, multiplicados, transformam-se em fonte de bem e adiantamento para a humanidade.

A plenitude e harmonia entre os seres humanos se dão como resultado de um processo de amadurecimento espiritual e se manifestam em discernimento, participação e ousadia para empreender a ação necessária.

Quando descobrimos os vínculos que nos unem aos nossos semelhantes, à natureza, ao meio ambiente e a todo o universo, não podemos deixar de viver com um sentido de reverência que impregna toda nossa vida. De maneira natural, aprendemos a respeitar a individualidade de outros, porque respeitamos nossa própria individualidade. Os recursos interiores com que contamos são um dom que recebemos para levar a cabo a finalidade última da vida: a união com a Divina Mãe (4). O uso sábio e prudente destes recursos gera harmonia e paz em nosso meio ambiente interior e, em conseqüência, no entorno. A aceitação da interdependência como uma atitude essencial para viver já não é uma imposição, senão o resultado de um processo de expansão da consciência.”

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(1) Cafh – A palavra Cafh tem raízes antigas. Para os membros de Cafh, simboliza o esforço da alma para alcançar a união com Deus. Ao mesmo tempo representa a presença do divino em cada ser.

(2) A Grande Obra – Os Ensinamentos de Cafh chamam Grande Obra ao conjunto de obras materiais, intelectuais e espirituais que nós seres humanos efetuamos para realizar nosso destino, de acordo com o Plano de Evolução Universal.

(3) Egoente – Ser egoente é ser consciente de si e de nossa relação com o todo, e discernir a forma de responder à responsabilidade que implica esta consciência.

(4) Divina Mãe – Os membros de Cafh reverenciam a Deus na imagem feminina da Divina Mãe.

quinta-feira, 31 de janeiro de 2008

Igualdade racial

A ministra da igualdade racial Matilde Ribeiro, negra, está sendo crucificada por ter gasto cerca de 180 mil reais em 2007 com seu cartão de crédito corporativo (dinheiro público para despesas oficiais de representação no exercício do cargo) o que incluiria, inclusive, comprinhas no free shop.

Ora, gente, pára de pegar no pé da moça. Ela está apenas exercitando o seu direito de gastar igual aos seus colegas (de colarinho) brancos!

quarta-feira, 23 de janeiro de 2008

Retiros Espirituais


Desculpem a breve ausência. Acabo de voltar do meu retiro anual de Cafh (www.cafh.org) em Campos do Jordão. Parada para manutenção programada e recarga de bateria.

Sete dias sem e-mail, sem celular, sem jornal, sem rádio, sem tevê, sem esposa, sem crianças, sem cachorro. Sete dias de silêncio, trabalho, estudo e meditação. Sete dias olhando para dentro, (re)conhecendo e pisando o território da alma.

Com diz o Gil " Se eu quiser falar com Deus tenho que ficar a sós, tenho que apagar a luz, tenho que calar a voz, tenho que encontrar a paz, tenho que folgar os nós dos sapatos, da gravata, dos desejos, dos receios, tenho que esquecer a data, tenho que perder a conta, tenho que ter mãos vazias, ter a alma e o corpo nus..."

Nos meus retiros espirituais, também eu descubro certas coisas tão banais:

- Que assim como o corpo precisa de sono, o espírito precisa de silêncio. Não esse fácil, de calar as palavras. Mas o de calar os desejos, os movimentos da mente, as ilusões do "eu".

- Que cada um de nós é livre para fazer escolhas. E que depois de fazê-las, a única liberdade possível é ser coerente com elas.

- Que a riqueza está na diversidade. E que isso é mais fácil de aceitar do que de praticar.

- Que a liberdade humana, às vezes, pode assemelhar-se a uma reluzente gaiola de ouro.

- Que só podemos ver fora de nós o que temos dentro de nós.

- Que a vida não é um destino. É uma viagem.

- E que nesse trajeto, nem tudo que é lícito, convém.

quinta-feira, 3 de janeiro de 2008

Desconfortos de fim de ano

Esta época de festas é muito interessante. Você começa recebendo um monte de cartões e mensagens de pessoas físicas e jurídicas que você nunca viu mais gordas, nunca vendeu nem comprou nada delas, sequer sabia que existiam. Mas todas te mandam um cartão virtual como se fossem seus velhos amigos.

Isso que dá ficar assinando listas de tudo quanto é coisa que você recebe, repassar e-mails com piadas, correntes, powerpoints de autoajuda, criancinhas desaparecidas, sem sequer dar-se ao trabalho de ocultar as centenas de nomes de seus amigos e conhecidos, que vão engordar as listas de "milhões de e-mails por apenas R$ 45,00!!!"

Mas uma forma moderna de seu endereço virar mais um, é deixar sua ficha cadastral nesses sites que agora viraram moda: os de amigo secreto virtual.

Isso mesmo, em vez da velha urna feita com caixa de sapatos, estrategicamente colocada perto do café, e dos bilhetinhos escritos à mão (geralmente a esquerda pro amigo não desconfiar), numa letra de forma que você nunca usa, com canetas de tintas esquisitas ou com frases compostas com letras e palavras recortadas de jornal, agora um colega cria um espaço virtual num site tipo www.amigosecreto.qualquercoisa, e em troca de um dossiê completo de todos os funcionários da empresa (única forma de usufrurir dos serviços), o site permite que todos mandem e recebam bilhetinhos virtuais. Não sem antes clicar no "concordo" do termo de compromisso (sem ler uma linha sequer, claro) o que dá ao site o direito de vender o seu e-mail para parceiros que vão depois inundar sua caixa postal com bobagens.

Depois da festa de amigo secreto da firma, onde todo mundo – da recepcionista ao presidente – fica irreconhecível, vem a tradicional ceia de natal em família. E junto com ela todas as discussões que se repetem ano após ano como se fosse a primeira vez: vai ser na casa de quem – ahhh não! de novo? quem leva o perú? fulano nunca traz nada mas come feito um esfomeado. E a louça que sempre sobra para a vovó lavar – coitada. Xiii, acho que este ano as crianças não vão mais acreditar que o papai noel não é o tio Zé? Se não servir, pode trocar viu, eu guardei a notinha...

E alguns dias depois, reveillon. Onze e meia vamos todos para a praia, roupa branca, chinelo de dedo. Pulamos as sete ondas e a cada pulinho um pedido: pedimos por nós e para nós, pelos amigos que pouco vemos, pela família que pouco nos vê, pedimos que tudo seja diferente no ano que começa. Pedimos o melhor, fazemos propósitos de mudar e quando a festa acaba o melhor de nós fica lá esparramado na areia, sendo engolido e vomitado pelo mar no seu interminável vai e vem: nossas pegadas, nossos saquinhos plásticos, embalagens de salgadinhos, isopores, pratos e copos descartáveis, velas, flores, garrafas com restos de champanhe barato.














Imagem: oglobo.globo.com


E assim começa mais um ano, no qual acreditamos que tudo vai ser diferente, mesmo a gente continuando a fazer tudo igual. Às vezes penso que o que a gente gosta mesmo é de que tudo permaneça como está. Sem supresas. Sem esforço. E principalmente sem desconforto.