A pandemia, o home office e o fato de estarmos todos em casa, sozinhos, pensando e produzindo como nunca imaginamos ser possível – ainda que interagindo com colegas e clientes via plataformas, têm me levado a refletir sobre o trabalho em equipe. O que é exatamente trabalhar em equipe? Que importância tem? O quanto a equipe é ou não determinante para alcançar um bom resultado? Em que circunstâncias a equipe é importante e em quais mais atrapalha do que ajuda? E qual é a dinâmica ideal entre os membros de uma equipe?
Sei que soa quase como heresia questionar ou colocar em dúvida o trabalho em equipe. No entanto (livre pensar é só pensar, como dizia Millôr Fernandes), pense comigo: boa parte dos grandes feitos da humanidade têm sido fruto da inspiração e do trabalho incansável e solitário de uma pessoa. Às vezes duas (irmãos Wright, irmãos Grimm...). Não consta, por exemplo, que na ficha técnica da capela sistina haja alguma outra assinatura além da do Michelangelo. Thomas Edison não inventou a lâmpada depois de uma dinâmica de trabalho em equipe. Também não se conhece a equipe que participou com Leonardo Da Vinci em todos aqueles inventos geniais, ou a que trabalhou com Graham Bell no projeto do telefone. Alguém sabe quem fazia parte da equipe de Santos Dumont? Será que Camões escreveu Os Lusíadas sozinho ou tinha uma super equipe por trás? Ah, mas Fernando Pessoa só produziu o que produziu porque eram vários autores. Sim. E todos inventados por ele. E os membros das equipes de Copérnico, Galileu, Mozart, Einstein, Darwin, quem eram mesmo?
Corta para os anos oitenta, início dos noventa. As duplas de criação das agências de publicidade trabalhavam isoladas, cada uma em uma sala. Até que alguém inventou que era preciso derrubar as paredes, quebrar as barreiras em benefício de uma maior interação entre as equipes. E surgiram os grandes salões, com todo mundo junto, muitas vezes amontoado até. E o que as pessoas fizeram? Enfiaram os fones de ouvido na orelha para poderem se concentrar e fazer o que tinha de ser feito. Perguntados décadas depois se os ambientes abertos beneficiaram a qualidade e a produtividade, a maioria dos diretores de criação e dos próprios profissionais afirmaram que não, pelo contrário.
Todos sabemos desde o tempo da escola que os trabalhos em grupo são invariavelmente feitos por um ou dois alunos e o restante da equipe só entra na hora de colocar o nome na folha de rosto.
E se uma equipe nem sempre é a melhor solução para fazer um trabalho excelente, para aprová-lo então, pode ser um desastre. Talvez você conheça aquela piada que diz que o camelo é um cavalo árabe depois de passar pela análise e aprovação de uma comissão. Talvez tenha sido por isso que Steve Jobs, criador da Apple, após uma reunião em que apresentou o I-pod ao conselho da empresa e todos acharam que aquilo não tinha futuro algum e não deveria ser produzido, fez um pedido aos conselheiros presentes: por favor senhores, o melhor que podem fazer quando terminar esta reunião é demitir-se. Só um permaneceu, eles lançaram o I-pod e o resto da história você conhece.
Não estou com isso querendo negar o valor do trabalho em equipe. Em algumas circunstâncias ele não só é possível, como necessário. E tem as suas vantagens. Há empresas e projetos que podem se beneficiar e ganhar muito por meio da junção de várias cabeças, ou braços. Veja uma orquestra. O que quero dizer é que, não raro, o talento individual pode desiquilibrar o jogo. E que no caso do trabalho em conjunto é bom deixar de lado alguns mitos. Por exemplo, que quanto maior a equipe, melhor. Que ter um líder forte e carismático é fundamental. E sobretudo aquela ilusão romântica de que numa boa equipe não podem haver disputas internas e a harmonia entre os integrantes é essencial. Não, meu amigo. Se assim fosse times de futebol seriam inviáveis. Então, se você é muito sensível, não lida bem com conflitos, leva tudo para o lado pessoal e não conhece resiliência, não serve para trabalhar em equipe. E é provável que tenha dificuldades até para trabalhar sozinho.